(...) a demanda da essência prossegue neste Porto sem filtro, cujo título - resultante de um jogo irónico e feliz, de tabágicas ressonâncias - nos remete para a singularidade de dois olhares sem mediação. Olhares próprios, diria: o do fotógrafo e o do escritor, capazes de nos dar a conhecer mais um Porto, o seu Porto. Uma essência, em suma, resultante da apropriação e recriação a que ambos procedem de alguns dos mais emblemáticos lugares e criaturas da cidade. Outros Portos existem, sem dúvida, como o do aprazível jardim da agitada Praça Marquês de Pombal junto à casa de Marques da Silva;o das quintas agrícolas de Paranhos (ou o que resta delas);ou o Porto operário e popular da Fontinha e do Bonjardim (tão decrépito), a juntar ao de S. Roque, Corujeira e Campanhã, com o seu belo vale a traçar com doçura a fronteira que separa este de outros concelhos;ou ainda o Porto oitocentista de Cedofeita, e o Porto burguês, de verniz moderno e cosmopolita (sê-lo-á?), que principia na Boavista - e cujos motes são hoje a Casa da Música e o museu de Serralves. Mas, em busca da essência, José Efe e Gaspar de Jesus inclinam-se para o coração da cidade, o centro histórico e seus prolongamentos: margens do Douro, pontes aladas, Sé, Ribeira, a camiliana Rua das Flores (a mais bela do Porto, onde o caminhante se detém e medita: "preciso dar tempo ao meu tempo"), a que se juntam a colmeia comercial de Santo Ildefonso, a sala de visitas que é a Praça da Liberdade, a Lapa, a zona do Palácio de Cristal, o eixo que termina na Rotunda da Boavista, com o leão e a águia a inspirarem o texto ôEstátuaöà (José António Gomes)