Preciso desde já de começar a falar da loja. Vou defini-la, para clareza do meu espírito dela. Por consciência minha da loja que me educou, e das outras como ela, que eu conheci, provinciais. Sob qualidade, porém, duma cidade baça. Loja: termo que adquiriu extensão a todo o espaço funcional de satisfação indiferenciada de comércio ou de serviços. Perdeu o típico de ser casa de venda a retalho ou de oficina. Perdeu o carácter da proximidade coloquial, vicinal, que implicava acolhimento. Nas lojas tradicionais se dava uma forma peculiar de relação humana. A diferença radical entre as antigas lojas e as também, não obstante, assim de novo designadas, encontro-a interiormente em mim, quando alguns amigos se admiram de eu não usar computador nem telemóvel, não ter cartões de crédito nem de Multibanco. A falta da minha loja tornou-me homem antigo, rebelde e compulsivamente analfabeto, que lamenta o consumismo com que aqueles aparelhos se aparentam. E não fico sozinho nesta irmandade. Milhentas pessoas há assim analfabetas, até nomes de fama.