Cada palavra poética é traçada com mão insegura, interrogando-se sobre o lugar que tem no mundo. Cada gesto é sentido como o lançar de um fio que logo se irá prender a outro para formar uma rede. E é a tessitura dessa mesma rede, o seu desenho harmonioso ou inquietante, que dará contas sobre a carga poética de cada texto, sobre a sustentabilidade de cada gesto nosso no mundo. E sobre o valor do sacrifício inerente a cada ganho. Um traço nosso é um arame onde se equilibram criação e desperdício. Já não vivemos na era das grandes estátuas, das obras que se erguiam como armas e fortalezas verticais obcecadas de vitória. Vivemos num tempo em que o menos tem de mostrar que é mais, em que as obras monumentais podem revelar-se pomposas e ridículas se comparadas a traços que se interrogam, tímidos, num caminho labiríntico que tira prazer e conhecimento nos meandros que encontra. Este trabalho reflecte uma partilha simples, uma confluência de mãos segurando o mesmo lápis, animadas por um impulso único - como um pulso único. O traço que aqui principia é, por isso mesmo, uma linha vazia, aberta à passagem de todas as vozes. Aqui, a escrita assinala mais do que um rito de passagem - assinala o ritmo lento da passagem da palavra e o seu inesgotável recomeço, sem pretensões de a circunscrever a um lugar.