Inácio Rebelo de Andrade, um estrangeiro definitivo, parafraseando Adolfo Casais Monteiro, no Portugal dos seus antepassados, para onde veio trazido pela descolonização da sua terra do Huambo. Essa estrangeiridade é, mais uma vez, a marca de água dos poemas reunidos neste volume, onde a escrita, mais referencial e narrativa do que sugestiva e metafórica, não prescinde de alguns acenos dramáticos de um eu que, parecendo temporalmente enunciar-se, se reconhece outro na intemporalidade de enunciados germinados em versos de saudade por um chão a que se pertence, mas a que se foi arrancado pelas vicissitudes da história mal interpretada por homens mais ambiciosos do que esclarecidos. Os versos têm, por isso, a imediatez dos impulsos da amadurecida e seletiva memória dos tempos angolanos, da primeira idade à idade adulta, da família em que se é criado à família que se cria, da escola formal em que se impunha ser outro à escola da vida e dos amigos, em que se fortalecia a liberdade interior de ser eu. São versos intuitivos para amenizar, não para disfarçar, as cicatrizes do exílio que, como Alexandre Herculano ensinou, instigam jeremiadas históricas, mas não reconciliam com o tempo e o espaço do desterro interior a que foi condenada a alma africana e tropical do autor. [Salvato Trigo]